terça-feira, 7 de dezembro de 2021

O REPÓRTER QUE LEVOU O SOTAQUE NORDESTINO PRA TV




Wilson ibiapina


Éramos três cearenses no telejornalismo da TV Globo: Francisco José ficava em Recife, eu em Brasília e o Luiz Edgar de Andrade no Rio. O mais conhecido é o Francisco José. Ficou famoso apresentando na televisão mais de duas mil reportagens feitas nos cinco continentes. 


Ele sai da emissora onde trabalhou mais de 40 anos mas fica na admiração dos brasileiros. O repórter gaúcho, Marcelo Canellas, exalta na orelha do livro do Chico José “40 anos no ar”,  a coragem desse cearense que se criou em Pernambuco, onde ingressou no jornalismo. Pense num cabra corajoso. Marcelo lembra do Chico José enfrentando pistoleiros, sequestradores, escalando cordilheiras, mergulhando nos oceanos, andando nas selvas, salvando índio. Espalhou pela televisão o sotaque nordestino. José Hamilton Ribeiro, outro jornalista destemido, escreveu que o  fenômeno Chico José ganhou dimensão nacional “pelo seu carisma, emoção e calor humano na narração, adornada por autêntico e valorizado acento nordestino”. 


Lançamento do livro 40 Anos No Ar

Num tempo em que a Globo queria padronizar a forma de falar de seus repórteres, fazendo prevalecer o chiado do s carioca, Chico José conseguiu impor o sotaque nordestino. Cheguei a acompanhá-lo em uma de suas viagens internacionais. Fomos pra Ásia cobrir a visita do Papa João Paulo II. Na época, quando não existia um só santo brasileiro, o Papa canonizou 130 coreanos de uma só vez, em Seul. Eram católicos perseguidos e queimados em fogueiras públicas. 


Chico José e Wilson Ibiapina na cobertura do Papa na Ásia


Fez matéria, também sobre a divisão da Coreia e os preparativos para os jogos olímpicos que ocorreram na Coreia do Sul.


Numa época em que só se falava em carnaval carioca, grande passarela das escolas de samba, Chico José mostrou ao país que Recife e Olinda tem frevo e bloco na rua. O carnaval pernambucano entrou no mapa turístico do país e até hoje a Bahia  corre para provar que atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu. Chico José, em Recife e José Raimundo, em Salvador, faziam um verdadeiro duelo para mostrar quem era o melhor. O carnaval nordestinos saiu ganhando.


No seu livro de memórias, Francisco José diz que “nem tudo dá certo em nossas missões”. Lembra que  vexames são frequentes, como cair da corda do rapel. Virar com o barco nas corredeiras de um rio, ir a Roraima quando a matéria era em Rondônia. E sai contando situações inusitadas, verdadeiros micos da profissão. A fama nunca lhe subiu à cabeça. Sempre se achou “um repórter rústico, matuto, de sotaque  sertanejo, enraizado na cultura nordestina.”


Lembra no livro que aprendeu com dois jornalistas da sua cidade do Crato. “Humberto Cabral e Antônio Vicelmo, que se destacaram na profissão. Mas nunca deixaram o pé de serra onde vivem e atuam até hoje”.


O repórter de 77 anos  usou a postagem na rede social para agradecer o carinho dos colegas e fãs. Revelou que não tem feito outra coisa, desde que foi anunciada a sua saída da Globo, a não ser, responder chamadas no WhatsApp, no Instagram, no e-mail e no celular. Mensagens carinhosas, de reconhecimento, carinho, muito afeto, além de tristeza e algumas de revolta", contou ele :


 – Sem dúvida, sou o desempregado mais enaltecido, nas últimas 32 horas. Não podia imaginar que tivesse tantos amigos pelo Brasil a fora. Mas quero tranquilizar a todos. Estou bem. Certamente, vou procurar outra Redação.


Família Ibiapina no lançamento do Livro de Chico José


Homenagem 80 anos Wilson Ibiapina