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Wilson Ibiapina
CRATO |
"Eu vou pro Crato
Comer arroz com pequi
Feijão com rapadura
Farinha do Cariri
..........
Eu vou pro Crato
Já não fico mais aqui
Cratinho de açucar
Coração do Cariri."
(Luiz Gonzaga)
O Ceará só tinha quatro cidades – Fortaleza, Sobral, Icó e
Aracati - quando a Vila do Crato foi elevada para a categoria de Cidade no dia
17 de outubro de 1853. Seis anos depois
o Crato recebia a visita de membros da Expedição Cientifica, criada por Dom
Pedro II para percorrer o Brasil identificando os recursos naturais e as
populações. A expedição era composta por naturalistas e pesquisadores. O Ceará,
escolhido como ponto inicial para os trabalhos, recebeu a partir de fevereiro
de 1859, alguns dos seus principais
membros que permaneceram por lá durante quase dois anos e meio. O médico e
naturalista fluminense Francisco Freire
Alemão, considerado o maior botânico
brasileiro do século XIX, chefiava a Comissão Científica. Ele registrou sua
passagem pelo Ceará num diário que foi
publicado pelo Museu Ceará e que o Sérgio Costa acaba de me enviar. Essa expedição
científica, batizada pela imprensa oposicionista, de «Comissão das
Borboletas», desembarcou em Crato às
10hs da manhã daquele dia 8 de dezembro de 1859. O médico ficou surpreso com a pobreza que viu
na rua do Vale, larga, longa, mas
triste. A região do Crato tinha paisagens naturais, incluindo áreas de mata
seca, cerrado, caatinga, mata úmida e carrasco. Essa biodiversidade tornava o
local ideal para as pesquisas.
Dois dias depois que chegou, Freire Alemão escreveu no
diário: "uma das coisas que mais nos atormentam é a quantidade de pobres,
de órfãos, de aleijados, de cegos, de presos da cadeia que nos vem pedir
esmolas, de joelhos e chorando." Essa gente levava ovos, galinhas, mangas
e queriam receber em troca uma esmola em dinheiro, claro superior ao valor do
presente. As histórias que ele ouvia do povo anotava no diário. Contaram-lhe da
existência de uma casta de morcegos que se você conseguisse jogá-lo ao chão sai
de dentro dele outro morcego. Outra historia que contavam era sobre um lugar em Timbauba. Lá,
cavando-se nele uma cacimba, logo aparecia água
com peixes. Nunca levaram o médico para ver o local.
Naquela época era difícil a entrega de correspondência. A
demora fazia com que o povo criasse histórias sobre rebeliões, queda de governos. Uma vez correu
o boato de que ordem da capital mandava retirar todas as tropas de linha do
interior. Quando a correspondência do dr. Freire chegou em janeiro de 1860, só
trazia notícias da família, nada de notícias sinistras como as que corriam pelo
sertão. Como se vê, a fake news, a famosa notícia falsa que nos atormenta hoje
vem de longe.
A viagem da Comissão
aos inúmeros recantos geográficos do Ceará e seus trabalhos, que se estenderam por dois anos e cinco meses,
foi toda ela registrada pelo pintor José
dos Reis Carvalho . É dele a primeira pintura
que se conhece do Crato. Uma
aquarela de 22x 49cm, uma peça
rara e preciosa que está no acervo do Museu do Crato. Nela pode se ver toda a
cidade a partir do Barro Vermelho. O grande pintor foi aluno de Debret na
Academia Imperial de Belas Artes. Há quem diga que ele nasceu no Ceará.
Aquarela do pintor José dos Reis Carvalho registra o Crato de 1860 |
O jornalista João Brigido, fundador do primeiro jornal do Crato, "O
Araripe", foi o cicerone dos
membros da Comissão. Anos depois João
Brigido, que foi tataravô de
Sérgio Costa, Maninho Brigido e Mário Monteiro, fundou o jornal Unitário em
Fortaleza. Diz o advogado Sérgio Costa
que foi de lá que ele brigou com metade do Ceará e fez a outra metade brigar
com ele. João Brígido, profundo
conhecedor da história caririense, passou inúmeras e informações sobre a vida
dos habitantes da região. O poeta
maranhense Gonçalves Dias, que fazia parte da Comissão Imperial apaixonou-se
pelo verde e pelas fontes prazerosas do Crato. Li no blog do Crato, na
Internet, que o poeta, chegou, inclusive a pensar em comprar terras no Crato,
mas morreu antes de realizar seu sonho . Algumas das descobertas feitas pela
Comissão Científica por aqui foram publicadas em "O Araripe." O Crato
prosperou, virou a Atenas do Ceará devido aos movimentos intelectuais que a
notabilizaram em todo o país.
José Ítalo Bezerra Viana escreveu que membros do Instituto
Cultural do Cariri escolheram a Revolução Pernambucana de 1817 com o episódio que projetou o Crato para a
história. Mas aí já é outra história.
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