Wilson Ibiapina
Um dia, os jornalistas Macário Batista, Nelson
Faheina e eu bebíamos uísque num bar da avenida Beira Mar, em Fortaleza, quando
notamos um cidadão que, à curta distância, não tirava os olhos de cima de nós.
Aquilo começou a incomodar.
- Estará curioso pra saber o que estamos bebendo?
perguntou o Macário.
- Acho que ele está querendo é tomar uma.
Disse o Faheina,
que colocou uma lapada do “red” num copo e ofereceu ao rapaz. Ele bebeu de uma
vez, lambeu os lábios e perguntou:
- Doutor, essa é a tal da Coca-Cola?
Pois não é que agora, antes mesmo de chegar ao
povão, o Johnnie Walker, o famoso Joãozinho Andador desembarca ao Ceará e
abocanha a Ypióca, a nossa marca de cachaça mais conhecida no Brasil e no
mundo.
Assim como o sabonete Phebo, que foi criado
pelos primos portugueses Antônio Lourenço da Silva e Mário Santiago, a Ypióca
surgiu no Ceará em 1846 por obra e graça da família portuguesa Teles Menezes e
agora, também passa para o domínio britânico.
A cachaça é a segunda bebida alcoólica mais
consumida no país, só perde pra cerveja. Quero ver se vão dizer agora que beber
pinga é coisa de pé sujo.
A família Teles vendeu a marca, uma destilaria
em Paraipaba, uma fábrica de envasamento em Fortaleza e um centro de
distribuição em São Paulo. Mete R$ 900 milhões no bolso e ainda vai fornecer
cachaça pra multinacional.
Ainda bem que o dia vai continuar amanhecendo
colonial. A cachaça Colonial, fundada por Tibúrcio Targino em 1923 é a
preferida pelo cearense, principalmente nos dias de chuva. Quando o céu está
nublado, a turma diz que o dia está colonial.
Os mais velhos dizem que a aguardente serve
para curar gripe, abrir o apetite, cortar a fome. Pode ser consumida nos
momentos de alegria e de tristeza. Um santo remédio.
Vejo que não era
invenção dos mais velhos. A aguardente,
que na Europa
era feita de cereais, frutos, raízes e sementes, era usada desde
a
Idade Média como medicamento.
A palavra água+ardente aparece com o sentido de
água da vida em vários idiomas. O professor Reinaldo Pimenta, mestre de
português, que especializou-se em descobrir a origem das palavras, conta que
tudo começou em 1300. O alquimista espanhol Arnau de Villanova destilou o vinho
e obteve álcool, pela primeira vez.
Foi chamado em latim de spiritus vini (espirito
do vinho). Até hoje, em
inglês, a palavra spirits serve para designar bebida
alcoólica
destilada. O químico suíço Paracelso foi o primeiro a substituir
spiritus
vini pela palavra álcool. Outra explicação dele: A palavra
vem do espanhol
alcohol, que veio do árabe al-kuhl. Deu origem a
cachaça árabe Arake, que tem
gosto de aniz. Nas línguas européias a
palavra álcool passou a designar
qualquer substância produzida por
destilação.
A água da vida foi batizada pelos irlandeses de
uisce
beatha - água da vida. Depois passou a ser chamada só de uisce (água,
termo
que virou em inglês whisky, que passou para uísque em português).
Os
russos batizaram sua cachaça de Vodka (aguinha).
Essas são as explicações
verdadeiras para a etimologia da
aguardente. Mas há os que preferem as
explicações inventadas pelo
povo, que são mais sedutoras.
Antigamente, no Brasil, para se ter melado os
escravos colocavam o caldo da cana-de-açúcar em um tacho e levavam ao fogo. Não
podiam parar de mexer até que uma consistência cremosa surgisse.
Conta a lenda
que, num dia, cansados de tanto mexer e com serviços ainda por terminar, os
escravos simplesmente pararam e o melado desandou! O que fazer agora? A saída
que encontraram foi guardar o melado longe das vistas do feitor.
No dia
seguinte, encontraram o melado
azedo (fermentado). Não pensaram duas vezes e
misturaram o tal melado azedo com o novo e levaram os dois ao fogo. Resultado:
o "azedo" do melado antigo era álcool que aos poucos foi evaporando,
formando no teto do engenho umas goteiras que pingavam constantemente.
Era
a cachaça já formada que pingava
(por isso o nome PINGA) As gotas, quando
batiam nas costas dos escravos, marcadas com as chibatadas, ardiam muito, por
isso o nome "AGUARDENTE".
Caindo em seus rostos e escorrendo até a
boca, os escravos viram que a tal goteira dava um barato, e passaram a repetir
o processo constantemente. Êta, como a mentira fica bem mais interessante que a
verdade!
Se for beber, não dirija.
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