domingo, 11 de maio de 2014

LEONARDO MOTA



Há 123 anos, dia 10 de maio, 7 horas da manhã de 1891, nascia em Pedra Branca, Ceará, Leonardo Mota, que tornou-se um dos maiores folcloristas do país, estaria completando 123 anos.. Jornalista, advogado, professor, em artigo no Correio do Ceará, onde foi redator-chefe, conta que “minha “graça” foi a princípio Leonardo Ferreira da Motta Filho. Depois, Leonardo Motta Filho, passando em seguida a Leonardo Motta, mas assinando Leon Motta, por algum tempo. Afinal adotei Leonardo Mota, com um “t” só. Do mesmo modo que grafava Leotta a princíipio e, mais tarde, Leota”.

Ocupou a cadeira 28 da Academia Cearense de Letras. Entre os inúmeros livros que deixou estão Cantadores – poesia e linguagem do sertão cearense; No tempo do Lampião – histórias de cangaceiros, anedotário e notas sobre poesia e linguagem populares; A Padaria Espiritual – história do movimento literário no Ceará, de 1892 a 1898 que editava o jornalzinho O Pão e proibia seus membros recitar versos cantando, o que era moda na época; Adagiário Brasileiro, coletânea de adágios e expressões proverbiais do Brasil que Leonardo Mota Neto publica aqui no FB. 

O famoso intelectual cearense morreu dia 2 de janeiro de 1948 em Fortaleza de um colapso cardíaco. A edição especial de 32 páginas e seis mil exemplares do jornal Correio do Ceará que circulou dia 2 de março toda dedicada a Leonardo Mota esgotou-se em menos de duas horas – um fato inédito na história da imprensa de Fortaleza. Hoje, nome de rua em Fortaleza, continua vivo na memória dos conterrâneos.

CABEÇA CHATA



Segundo Leonardo Mota, folclorista, jornalista, advogado e escritor, foram os piauienses e maranhenses que nos batizaram assim durante a guerra pela independência, que é por onde vou começar essa história.

Dia 13 de março completa 191 anos da batalha do Jenipapo. Poucos sabem dessa briga que foi decisiva para a independência do Brasil. Ela ocorreu às margens do riacho Jenipapo, no Piauí. Piauienses, maranhenses e cearenses enfrentaram as tropas do major João José da Cunha Fidié, comandante das tropas  portuguesas encarregadas de manter o norte da ex-colônia fiel ao reino de Portugal. Dom João VI, de volta a Portugal, reconheceu que a independência do Brasil era difícil de conter-se. Aí achou de preservar o norte, reunindo Pará, Maranhão e Piauí como colônia portuguesa. Enviou então para Oeiras, capital do Piauí, o major Fidié. Os brasileiros sem armas de guerra e sem experiência, perderam a batalha  mas ajudaram a mudar o destino da tropa portuguesa que foi aquartelar-se em Caxias, no Maranhão. Lá, piauienses e cearenses fizeram um cerco obrigando ao major  Fidié a se render  preservando a unidade nacional. 

Para que a independência se fizesse em terras piauienses foi preciso a ajuda dos cearenses. Eram homens simples, vaqueiros e roceiros humildes praticamente com a coragem e a cara. Receberam uns bonés, achatados, grandes que, segundo  Leonardo Mota, deram origem ao apelido de Cabeças-Chatas, alcunha que nunca mais nos largou. Há quem diga que temos a cabeça chata porque dormimos em rede.  Leota lembra que em São Paulo  acham  que o achatamento de nossas cabeças vem do fato de, desde criancinha, nossas mães dão pancadinhas na cabeça, estimulando-nos: “Cresça, meu filho, cresça para ir ganhar dinheiro em São Paulo”... Leonardo Mota dizia que temos um consolo, o mal é de muitos. “Na Europa, os alsacianos são os cabeças-quadradas (têtes carrées) e os naturais de Calais são os cabeças-de-areia (têtes sableuses). Essa história está no livro Cabeças-Chatas, de Leonardo Mota, editado pela Casa do Ceará em Brasilia, onde traça o perfil de alguns cabeças-chatas como Paula Nei, Capistrano de Abreu, Quintino Cunha e jangadeiro Francisco José Nascimento, o Dragão do Mar, um dos líderes da abolição dos escravos no Ceará que se antecipou ao Brasil em mais de quatro anos.

PAULA NEI, O BOÊMIO QUE FAZIA VERSOS




O jornalista e poeta cearense Paula Nei só tinha 39 anos quando morreu no dia 13 de novembro  de 1897, no Rio de Janeiro. Levava vida desregrada e morreu jovem como todos os seus contemporâneos. Álvares de Azevedo, 21 anos; Castro Alves, 24 anos, Fagundes Varela, 33 anos.

Quando saiu do seminário, Paula Nei, pressionado pelo pai, alfaiate, foi estudar medicina. Leonardo Mota, na biografia do maior boêmio que o Rio conheceu no fim do século XVIII, escreveu que esse filho de Aracati aprontou. E lembra uma prova oral a que foi submetido quando aluno de medicina. O professor de Obstetrícia, Visconde de Sabóia, expõe um caso de parto  complicado. O mestre descreve em cores trágicas o perigo em que se encontra a parturiente e pergunta  : - Em tais conjunturas o que faria?

Paula Nei diz que faria isto e mais isto.

O mestre: - matava o feto.

Paula: - Bem, dr. Mas naturalmente eu me aperceberia disso e lançaria mão de tais e tais detalhes.

- Matava a mãe

- Não mestre, porque, de novo, a tempo eu recuaria e passava a proceder assim...

- Neste caso matava a mãe e o feto.

- Ah, professor, nesse caso eu via que o negócio estava mesmo encrencado e salvaria brilhantemente a situação mandando chamar V. Senhoria.

Paula Nei comia pouco, bebia muito. Um dia, leva Aluísio Azevedo ao boteco Caboclo, do português Quincas que abriu o verbo para o romancista: - Olhe, isto de comedoria virou coisa do passado. Já foi o tempo. Hoje, olhando para Nei, o povo só quer beber. Só consigo vender pastéis. Paula Nei faz um aparte: - E pensar-se, Aluísio, que isto já foi um pais de apetite. Comia-se de tudo, até bispo. O que estragou o paladar do nosso povo foi a civilização.

Foi andando e bebendo por esses botecos que fez amizade com o Conde de Helzberg, um alemão que durante o dia dirigia uma empresa funerária e à noite participava das farras de Paula Nei. Certa madrugada, o poeta cearense queixou-se para o Conde que não tinha onde cair morto. O alemão, que já estava embriagado, chorou comovido e prometeu que daria a ele um enterro pomposo: “coche de primeira classe, cavalos de raça negros, cocheiro e ainda carneiro perpétuo, missa de sétimo dia com órgão. Um funeral pra mais de 2 a 3 contos.” Paula Nei escreveu que um dia estava sem um só tostão no bolso e foi negociar seu enterro de luxo com o Conde. Propôs rebater com desconto o seu funeral, baixando de primeira para segunda classe. O alemão topou, deu-lhe dinheiro e exigiu recibo. E continua Nei: “Noutras pândegas reduzi a segunda classe à terceira e a terceira à quarta classe. Há dias, bebi o carneiro perpétuo e hoje estou reduzido à vala comum, que é o albergue noturno da eternidade. Antes assim! Dificilmente eu me acostumaria a morar só, num carneiro perpétuo... Na vala comum, pelo menos, terei companheiros e continuarei a ser na morte o que fui em vida: o homem das multidões”.

Quando da Proclamação da República, o povo saiu em passeata pelas ruas do Rio, parando em frente a sede dos jornais que apoiaram o movimento. Na sacada da Gazeta de Notícias, onde trabalhava Paula Nei, estavam várias autoridades, entre elas Luís Murat e o general Serzedelo Correia. Paula Nei completamente embriago subiu de quatro pés as escadas até a redação. De lá , acotovelando meio mundo conseguiu chegar à sacada, transformada em tribuna pelos oradores que se revezavam. A massa reconheceu Paula Nei e começou a gritar o nome dele para que também falasse. Nei deu um passo em falso  e foi cair nos braços do general Serzedelo. Naquela posição ele falou: “concidadãos! O povo amparado pelo Exército: eis a República!” O povo delirou, Paula Nei se ajeitou e fez um aplaudidíssimo discurso.

Paula Nei foi um abolicionista. Levou seu colega jornalista José do Patrocínio ao Ceará para reforçar a campanha abolicionista que transformou o estado no primeiro da Federação a abolir a escravidão em 1884, quatro anos antes da Lei Áurea. Foi José do Patrocínio que, por esse fato, chamou o Ceará de “a terra da luz”. O feito inspirou Paula Nei que fez o poema Abolição:

“A justiça de um povo generoso,
Pesando sobre a negra escravidão,
Esmagou-a de um modo glorioso,
Sufocando-a com a lei da Abolição.

Esse passado tétrico, horroroso,
Da mais nefanda e torpe instituição,
Rolou no chão, no abismo pavoroso,
Assombrado com a luz da Redenção.

Não mais dos homens os fatais horrores,
Não mais o vil zumbir das vergastadas,
Salpicando de sangue o chão e as flores.

Não mais escravos pelas esplanadas!
São todos livres! Não há mais senhores!
Foi-se a noite: só temos alvoradas! “

O amor de Paula Nei pelo Ceará pode ser traduzido no lema que  criou: “Pelo Brasil eu morro, pelo Ceará eu mato. Leonardo Mota lembra que ele era de surpreendente memória e discutia com garbo qualquer assunto. Um verdadeiro mistério, pois ninguém sabia a que horas do dia ou da noite era que ele estudava ou lia. O biografo transcreve uma confissão do próprio  Nei: “Eu não leio! Não leio, porém faço mais: observo. O meu livro é a vida, obra saída dos prelos de Deus” .  Deve ter sido de lá que tirou o poema que fez em homenagem a Fortaleza:

“Ao longe, em brancas praias embalada
Pelas ondas azuis dos verdes mares,
A Fortaleza, a loura desposada
Do sol, dormita à sombra dos palmares.
Loura de sol e branca de luares,
Como uma hóstia de luz cristalizada,
Entre verbenas e jardins pousada
Na brancura de místicos altares.

Lá canta em cada ramo um passarinho,
Há pipilos de amor em cada ninho,
Na solidão dos verdes matagais...

É minha terra! A terra de Iracema,
O decantado e esplêndido poema
De alegria e beleza universais!

Coelho Neto contou, durante visita que fez a Fortaleza em 1917, que seu enterro foi uma apoteose. Havia de tudo no imenso cortejo fúnebre, desde ministros de estado até humildes vendedores de jornal. E todos quantos lhe viram o cadáver no ataúde se espantaram. É que lhe ataram no alto da cabeça um lenço branco que lhe segurava os maxilares. Estava aí o espanto de todos: ninguém podia compreender Paula Nei de boca amarrada.

O SEGREDO DE NAPOLEÃO BONAPARTE



O texto enviado pelo jornalista J.B.Serra Gurgel revela a infelicidade do líder francês no amor:

"Um tempo atrás, o blog  História sem fim revelou que Napoleão Bonaparte era um cara romântico, que sempre escrevia cartas para a sua amada Josefina (apesar de ela nunca ter feito o tipo esposa fiel).

Sorte no front, azar no amor? Parece que a espada que o cara usava para conquistar as mulheres não era tão poderosa quanto a usada para desbravar territórios. Ao menos é o que sugere um legado curioso deixado pelo Imperador: seu pênis.

Napoleão morreu em 5 de maio de 1821, na Ilha de Santa Helena. De acordo com historiadores, seu corpo passou por uma autópsia. Uma das versões é a de que o procedimento teria revelado que ele morrera de câncer no estômago. Mas essa não foi a única coisa revelada na ocasião. “Seus órgãos reprodutivos eram pequenos e aparentemente atrofiados. Dizem que ele ficara impotente algum tempo antes de morrer”, teria dito o Dr. C.Mac Laurin.

Como se não bastasse ter sido descrito como “pequeno”, a lenda afirma que o pênis de Napoleão fora cortado na ocasião. Segundo essa história, depois da autópsia o dito cujo teria caído nas mãos de um padre e desaparecido.

Em 1971, 150 anos após o incidente, um órgão, apresentado como o pênis de Napoleão, apareceu no Christie’s Fine Arts Auctioneers, em Londres. Um visitante o descreveu como “um pequeno cavalo-marinho”, já que ela media cerca de 2,5 cm.

Mas o que fazer com o pênis de Napoleão? Os caras decidiram leiloá-lo – e o lance inicial foi estipulado em 13.300 libras. Sem êxito nas vendas (porque, né?), o produto saiu do mercado. Em 1977, John Lattimer, urologista e professor de Urologia da Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque, adquiriu o membro por US$ 3.800 e permaneceu com ele até sua morte, em 2007. O legado do professor Lattimer tinha outros pertences inusitados como um colar manchado com o sangue de Lincoln e uma ampola de cianeto de Hermann Göring. 

O membro napoleônico caiu nas mãos de familiares e a filha de Lattimer tentou vendê-lo por 100 mil dólares em 2011, segundo a TIME. Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, Bonaparte permanece em sua cripta em Paris. Sem pênis. Fonte: O livro das listas, David Wallechinkky e Amy Wallac

No período que esteve exilado em Santa Helena, Napoleão teve um caso com Albine Hélêne, mulher de um dos serviçais que o acompanhou no exílio. Em 1819, a jovem Albine abandonou a ilha com uma criança chamada Josephine, a qual o derrotado imperador reconheceu como sua filha.

Curiosamente, antes de falecer, Napoleão pediu que seu coração fosse enviado à Maria Luísa. Entretanto, as autoridades britânicas não permitiram que este último e macabro gesto romântico fosse realizado.

domingo, 4 de maio de 2014

OS CIRCOS QUE ALEGRARAM NOSSA VIDA





Ainda menino em Ubajara ou Ibiapina o simples anúncio de que “ o circo chegou” era motivo de grande alvoroço nas cidades. A  expectativa era grande entre adultos e crianças. O espetáculo que íamos ver teve sua origem na antiguidade, passou pelas arenas romanas e chegou à idade média com grupos de malabaristas, artistas de teatro e comediantes viajando pela Europa. Coube ao inglês Philip Astley, em 1769, organizar as apresentações circenses debaixo de uma tenda de lona que mudava de cidade constantemente. 

O circo da minha infância no interior do Ceará não tinha cobertura. Lona só dos lados.  “Hoje tem espetáculo?"  - Tem sim senhor?  - Às 8 da noite? - Tem sim senhor. Arrocha negrada – Uuuuurrra!!! gritava a meninada que tinha um dos braços pintado com uma numeração, o que lhe daria direito a entrar de graça. A propaganda pelas ruas da cidade era conduzida por palhaços acompanhados pela garotada. Hoje temos um palhaço deputado federal, o cearense Tiririca. No passado, o máximo que um palhaço  conseguia era aparecer na televisão, como o Bozo, Carequinha ou Arrelia. O palhaço mais famoso do Brasil foi Piolin, encarnado pelo paulista Abelardo Pinto, de Ribeirão Preto. Morreu em 1973 mundialmente conhecido. Além de grande criatividade cômica, Piolin era equilibrista e ginasta. Foi considerado "o maior palhaço do mundo". Ele nasceu no dia 27 de março de 1897. O dia de seu nascimento foi escolhido para ser o Dia do Circo no Brasil.

Circo Nerino


Um outro palhaço famoso foi o Nerino. Mas esse fui conhecer quando estava mais velho e morando em Fortaleza. Minha casa ficava na avenida padre Ibiapina, ao lado da praça São Sebastião, local destinado a armação dos circos.  Nerino, dono do circo, era o palhaço Picolino Segundo que matava todos de rir com suas estripulias. O circo Nerino foi criação do pai dele, Picolino Primeiro, em 1913. O Nerino fez sua última apresentação em setembro de 1964, em Cruzeiro do Sul, em São Paulo, depois de marcar a memória de muitos garotos país a fora.

Circo Tihany


Desses circos paulistas, o único que ainda  está com a lona armada é o Tihany. Fundado por Franz Czeisler em 1954 na cidade de Jacareí, em São Paulo, o circo sobrevive porque foi levado para o exterior.  A origem do nome vem de sua cidade natal Tihany, na Hungria. Foi ainda com o nome de Circo Mágico Tihany que esteve em Fortaleza. Antes de vir para o Brasil como imigrante em 1952, Franz já trabalhava nos palcos da Hungria, Romênia e Tchecoslováquia, como ator, bailarino e, por último, mágico. Após uma rápida passagem pela Flórida, o circo fixou-se em Las Vegas, onde Czeisler, de 96 anos, vive até hoje. O sucessor dele e atual diretor do Tihany Spetacular Circus   é o argentino  Richard Massone.

Circo Garcia


De todos esses circos o que me marcou mais foi mesmo o Garcia. Muita gente se apaixonou pelas artistas. Algumas delas ficavam hospedadas na mansão dos Limaverde, na rua Clarindo de Queiroz, em frente a praça São Sebastião, onde foi armado várias vezes. Antolim Garcia dizia que todo circo tem que ter uma velha. É a mãe de artistas, pode ser a mulher do empresário. Garcia dizia que circo sem velha não existe. Ela costura, examina uma colega grávida, chama a parteira, faz massagens, faz tudo, zela por todos e ainda faz fofocas, intrigas que ela mesmo se encarrega de desfazer. 

No livro que escreveu sobre o circo em 1962 Garcia comenta os costumes e prolemas dos companheiros que amou. Ele revela que no Brasil o circo se compõe de duas classes: uma representada pelos tradicionais, que é formada por artistas nascidos em circos e que são a continuação dos imigrados que iniciaram a vida circense no país. A outra classe é a dos aventureiros, constituída por artistas que antes exerciam outras atividades e que ingressaram para o circo por conveniência ou boemia.

A  velha e o Curió

O Garcia tinha uma velhota que comandava a classe dos aventureiros em 1955, na época em que o circo se preparava para ir à Guiana, sua primeira viagem internacional. Essa família tinha cinco membros. Essa senhora, viúva, recebeu o nome de Babá pelo cuidado que tinha pela família, duas filhas de criação, um garoto sapeca de uns cinco anos e o Curió, um caboclo atarracado que possuía conhecimentos acrobáticos. Ele viu nas meninas de Babá as partners que precisava para montar um grande ato e com ele entrar no mundo do espetáculo. Aproximou de Lelé, a mais velha das irmãs e começou um namoro que logo ele quis transformar em casamento. A velha Babá, temendo que Curió, depois de casado fosse embora com sua filha, foi contra e armou um golpe. Chamou Curió pra uma conversa. Disse-lhe que na sua família casamento sempre foi considerado um ato de grande responsabilidade. Que na família sempre se apoiou, sem objeções, a escolha de qualquer de seus membros, desde que se obedeça praxes legadas dos antepassados. Curió, balançando a cabeça como concordando com aquilo, dizia “cumprirei tudo”. E a velha afirmou que “nosso costume é casar primeiro os mais velhos”. Curió sorriu na certeza de que tinha escolhido a Lelé, a mais velha. “Sem que os mais velhos casem os jovens não poderão contrair matrimônio” - Certíssimo, disse Curió.
- Perdão, atalhou a velha. É bom que você saiba que a mais velha aqui, embora não pareça, sou eu; por conseguinte, antes que eu encontre um novo marido, Lelé não poderá casar-se.”
E a velha continua, descaradamente: “diante desse imperativo só vejo um recurso.”
-Qual?, pergunta um impaciente Curió. A velha lança um olhar furtivo e sugere; -Case comigo.
Curió, que ia levando uma xícara a boca, tomou um susto tão danado que entornou o café sobre calça. Babá pediu que trouxessem um pano molhado com água quente, ajoelhou-se diante do rapaz e começou a limpar as nódoas de café. Curió, que na verdade estava mesmo afim de montar um grande ato que permitisse que se apresentasse num grande circo, agarrou as mãos da velhota e disse: “sabe, nunca gostei de ter por mulher uma jovem piegas e inexperiente. A mulher que verdadeiramente gostei à primeira vista é você. Babá levantou-se e aos gritos chamou as duas filhas e comunicou: “O Curió aqui pediu-me para casar com ele e eu aceitei.

Uma vez casado com a matrona que sofria do fígado e de pedras na bexiga, Curió montou logo um grande ato com as duas caboclas. Babá pedia ao marido que levasse Lelé aos cinemas e passeios já que a bílis não lhe permitia sair. Os três passaram a viver felizes.
           
O livro de Antolim Garcia que conta essa história de Babá e Curió foi escrito em 1962, quando seu circo comemorava 47 anos de existência .

Garcia desce suas lonas

O fim do circo Garcia foi noticiado assim pelo Correio Popular, de  Campinas, matéria assinada por Rogério Verzignasse :

"As cortinas do espetáculo se fecharam. Para sempre. Atolado em dívidas que chegam à casa dos R$ 800 mil, o Circo Garcia, o mais antigo do Brasil, encerrou as suas atividades. Fundada em Campinas, em 1928, a companhia circense chegou a figurar, na década de 70, entre as quatro maiores do mundo.

Seu fundador foi Antolim Garcia, paulistano, filho de imigrantes espanhóis, que conduziu o Circo Garcia ao sucesso no Exterior. O apogeu aconteceu entre 1954 e 1964, quando os espetáculos, com cinco lonas e cerca de 200 artistas contratados, viajaram por 72 países do mundo.


Desde a década de 80, o Garcia enfrentou crises financeiras sucessivas.  A arte circense já encarava a concorrência da televisão, que passou a oferecer diversão sem que as pessoas precisassem sair de casa. Muitas lonas foram baixadas, no Brasil inteiro. Mas a instabilidade econômica atual foi decisiva. A alta do dólar tornou inviável o pagamento de artistas internacionais, com remunerações atreladas à moeda norte-americana. O Garcia chegou a pagar US$ 2,7 mil por semana a trapezistas mexicanos. Quase toda a dívida atual é referente a salários atrasados.  Alguns acontecimentos marcaram, de maneira particular, a derrocada do Garcia. Antolim morreu em 1987. Desde aquele ano, o grupo era administrado por sua mulher, Carola Boets, e pelo filho dele, Rolando Garcia, que faleceu em setembro de 2002  “Sem meu enteado, fiquei muito sozinha”, afirma Carola. “Aqui nós estávamos empatando dinheiro”. Além de Rolando, morreram desde o 2000 os outros dois filhos de Antolim, Ruth e Romero.  No dia 29 de dezembro de 2002, aconteceu o último espetáculo do Garcia, que estava montado na Avenida Guarapiranga, região do Santo Amaro, Zonal Sul paulistana. Sinal cruel dos tempos. Só 280 pessoas compareceram ao espetáculo, e se espalharam pela arquibancada construída para 3.500 espectadores. A arrecadação, lastima Carola, não foi suficiente nem para pagar os R$ 300,00 gastos com a manutenção dos geradores em uma noite de espetáculo."

Homenagem 80 anos Wilson Ibiapina