segunda-feira, 29 de junho de 2015

AYRTON, O PINTOR ( AYRTON ROCHA JUNIOR )

 
NUM ESTILO MUITO PRÓPRIO, MUITO PESSOAL, O EXPERIENTE PINTOR CONTEMPORÂNEO AYRTON, TRAZ SEMPRE EM SUAS CRIAÇÕES, DE LINDAS CORES, BELEZAS E SENTIMENTOS, A SUA PERSONALIDADE FORTE E AO MESMO, DOCE E SUAVE, DE SUA ALMA DE GRANDE ARTISTA!
 
 
 VENDEDOR DE GUABIRABA - 2013 - 80/100CM - FIGURATIVO !


A IMPRENSA DO CEARÁ ESTÁ DE LUTO. MORREU CIRO SARAIVA,76 ANOS

Ciro Saraiva


Wilson Ibiapina
 
Sábado pela manhã, ao abrir o computador, deparei-me com este e-mail:
“Sou neto do Jornalista J. Ciro Saraiva. Venho por meio deste comunicar-lhe o falecimento do meu avô Ciro Saraiva nesta madrugada de sábado. O velório ocorrerá a partir das 14 horas na Ternura, aldeota - Fortaleza, e o sepultamento está previsto apenas para amanhã de manhã, no Cemitério São João Batista.”
João Ciro Saraiva de Oliveira, mais  conhecido como Ciro Saraiva, nasceu em Quixadá. Começou na imprensa em 1953, no jornal Estado. Depois trabalhou no Correio do Ceará, O Povo e Tribuna do Ceará. Foi radialista na Ceará Rádio Clube, Dragão do Mar e Radio Uirapuru. Trabalhou na TV Cidade e TV Ceará  Foi secretário de Comunicação dos Governos Manuel de Castro e Gonzaga Mota e fez parte da equipe de marketing da vitoriosa campanha de Tasso Jereissati ao governo do Ceará em 1986. Em 2011  lançou o livro Nos tempos dos Coroneis”, em que relata os principais fatos da política cearense durante a época do regime militar, do Governo de Parsival Barroso, em 1960 à campanha de Tasso Jereissati, em 1986. Depois escreveu Antes dos Coroneis. Ultimanente, vivia para escrever seus livros e tratar da saúde. Era diabético e  fazia a hemodiálise para ajudar no funcionamento dos rins, problema que o matou nessa madrugada. Nos últimos anos deixou a religião católica, tornou-se  evangélico. Ele foi tambem O MELHOR REI MOMO DO CEARÁ
Quem encontrava ultimamente  o circunspecto jornalista Ciro Saraiva é incapaz de imaginar que este senhor que gastava bom tempo de sua vida em orações e em leitura da Bíblia, foi um dia o mais espirituoso, alegre e divertido Rei Momo da história do carnaval de Fortaleza.
Essa passagem na vida do brilhante escritor, ele procurava esquecer por achar o carnaval cada vez mais longe do povo, que essa “explosão cultural popular virou coisa de rico marcada pela ferocidade do sexo, pela droga e pelo dinheiro”, conforme ele assinala em  seu livro “No Tempo dos Coronéis”.
Mas tudo começou por causa do incidente que ocorreu no Country Club de Fortaleza, onde hoje funciona o restaurante Serigado, comandado pelo cronista esportivo Silvio Carlos.
Era o carnaval de 1961. O juiz de menores, Cândido Couto, recebeu denúncia de que menores estavam participando da festa do Country, a segunda-feira mais animada do carnaval cearense. O juiz mandou que a polícia fosse lá retirá-los da festa. A tropa chegou no momento em que o Rei Irapuan Lima e sua corte visitava o clube.
O Edilmar Norões, que fazia parte da corte como cronista carnavalesco, lembra da cena. Algum gaiato gritou para a polícia não prender o Rei Momo. Irapuan Lima, indignado bradou: “O Rei é imprendível”. A Polícia abriu fogo no salão. O fotógrafo Vieira Queiroz, do Correio do Ceará, foi baleado e o Rei teve que pular o muro para escapar dos tiros.
Depois dessa confusão o Rei Momo abdicou. O presidente da Crônica Carnavalesca, Chico Alves Maia, entrou em campo para encontrar seu substituto.
Para alegria geral a escolha recaiu sobre um jornalista gordinho, recem-chegado de Quixeramobim. Com o nome de Cirão I, o novo Rei Momo se vestiu de Nero e saiu às ruas, segundo ele, com “a disposição de tocar fogo no Carnaval de Fortaleza”. Seu grito de guerra era “Vivo o Cão”.
Um dia, num baile no clube Iracema, Cirão sobe no palco e, ao lado do comandante da Região Militar e do ministro Expedito Machado, proclama no microfone: “O Rei, o minisitro e o general! Viva a irresponsabilidade!”
Foi, sem dúvida, o mais animado e debochado Rei do Carnaval cearense. Sua performance aumentava a alegria dos foliões. Só ia pra casa com o sol raiando.
Não fez como aquele rei Momo do passado que foi destituído em plena segunda-feira de carnaval. Foliões, que voltavam de uma festa às 6 horas da manhã, flagraram o Soberano de pijama e comprando pão numa padaria.
A Rainha que acompanhava Cirão, Irani, era muito bonita e chegou a provocar uma crise de ciúme na casa dele. Entre a Rainha do Carnaval e a Rainha do Lar, o Rei optou pela Rainha do Lar. Inventou que estava doente e como já era 1965, em plena ditadura militar, ele saiu-se com essa: “Só volto ao carnaval quando houver condições de fazer alegria no Brasil”.
No carnaval seguinte o Rei já era o Javeh.
Em seus últimos dias, o jornalista e escritor Ciro Saraiva, vivia para Jesus, não ousava sequer repetir o brado de guerra que ele usava para incentivar seus súditos. Considerava uma injuria a Deus.
Na verdade, nunca mais apareceu um Rei Momo tão espontâneo, carismático que nem ele. O poeta Rogaciano Leite sentenciou um dia: “No Ceará só existiram dois reis: Luisão e Cirão. O resto é palhaço.”
Eu acho que o melhor mesmo foi o Cirão Primeiro e Único. Que Deus o tenha.

O GRANDE LÍDER QUE DORMIU LÁ EM CASA

 
Nira Foster
Éramos três. Jovens jornalistas ainda preocupados com furos, sair na frente, em ver o que escrevíamos estampado na primeira página. Cada uma tinha um quarto no apartamento meio república. Quem não era namorado, podia se aboletar no sofá da sala ou mesmo no carpete, quando mais de um hóspede.
A roda com a participação do sindicalista foi no carpete. Escutávamos embevecidos - as três e os respectivos -, a opinião dele, pouco antes elevado à categoria de líder nacional em capa histórica da Revista Isto É. Nossas perguntas saíam aos borbotões. As certezas eram conferidas uma a uma com o nosso operário favorito. A animada conversa varou a madrugada.
Enganos são mais permitidos aos jovens. A hipótese é que eles têm mais chances/tempo de mudar. Com certeza mudamos todas e os nossos respectivos se foram nas asas de outros amores. O operário chegou ao poder. Aliás, esse era quase o título de um filme que os mais radicais quase que exigiam que víssemos. Como estudante também de cinema, tive que ver esse e outros tantos filmes. Os do neorealismo italiano e do expressionismo alemão faziam parte do nosso manual de pretendentes a esquerdistas e eram salvo conduto para as aulas do querido Vladimir Carvalho. Mas, confesso, hoje sem pudor, que dormi no Fellini 8 ½, sem saber em que escola o filme se encaixava. Tentei uma segunda vez na fase “madura”. Cochilei bastante.
Nosso líder dormiu no sofá. Cuidadosamente arrumado pela companheira de república experiente na cobertura do movimento sindical em São Paulo. E de quem o nosso operário era a “fonte de esquerda”. Fontes de direita a gente corria longe, embora pela cartilha do velho jornalismo, fôssemos obrigadas a ter e a ouvir. Que bom que quando mais velho a gente consegue compreender, à luz da teoria da relatividade, o que é esquerda e direita. E não perder tempo no Facebook
Ao ouvir essa história, uma amiga antes petista roxa e hoje nem tanto, comentou que dormir no sofá era subir de status. Pois, ela disse, no tempo de vacas ainda mais magras nosso herói costumava passar madrugadas, quando em Brasília, fungando dentro de um fusca de algum companheiro, em companhias variadas. Pelo tamanho do carro, presumo, uma de cada vez. Eu, nunca gostei de carros da Volkswagen.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

O CANDANGUÊS QUE ENTRA NA MODA

 

Wilson Ibiapina
 
 
Brasília é um caldeirão cultural em efervescência. Dele começa a surgir um dialeto próprio, mistura resultante do fluxo migratório. Gente de todo o país desembarcou aqui com seus costumes e várias formas de falar.
 
Minha filha, quando pequena, chegou em casa falando “Arre égua, tchê”. Os brasilienses já trocaram o você por tu e uma conversa entre dois jovens fica difícil de ser entendida por quem não é daqui. Tem uma gíria própria. Interessante é que em Ceilândia, uma grande cidade de nordestinos, fala-se diferente de Brasília, onde bicicleta virou camelo, ônibus é baú. Os jovens brasilienses chamam o micro ônibus de zebrinha, quebra mola de lombada. O sinal luminoso, que em São Paulo é semáforo, aqui é Sinal. O radar do Detran que arrecada dinheiro dos motoristas, são os famosos pardais.
As palavras adotadas saem desse caldeirão, onde foram colocadas por cariocas, nordestinos, gaúchos mineiros , goianos e paulistas. Pelejar é brigar, tentar. Pão francês virou pão de sal. O balão da dona Sara, é a rotatória que fica no caminho do aeroporto. As tesourinhas são os retornos.
 
 
As famosas tesourinhas
 
O jornalista Paulo José Cunha, também professor da UnB, me disse que a colega dele, a professora de lingüística Stella Maris Bortoni, pioneira no estudo das mudanças na linguagem no Distrito Federal, conclui que os adultos podem conservar traços, mas os filhos perdem todas as características regionais. Para a professora, autora de livro sobre o falar candango, os diferentes sotaques se ajustam no intuito de facilitar a comunicação. O brasiliense chama a passagem de nível, o pequeno túnel que liga as asas norte e sul por baixo da rodoviária de ”buraco do tatu”.
 
 
Buraco do Tatu
 
 
Pregador de roupas
O pombal da praça dos 3 Poderes, implantado no governo de Jânio Quadros virou, pelo seu formato, o Pregador de Roupas.
 
Também por causa do formato, o anexo do Itamaraty, que na verdade é Palácio dos Arcos, desde quando foi ocupado por Fernando Collor, antes de assumir a presidência, ficou conhecido como Bolo de Noiva. Em entrevista, publicada pelo Correio Brasiliense em 2011, a professora Stella explica que o ar cosmopolita da fala do brasiliense se dá por dois motivos. O primeiro é porque Brasília não aceita ser uma cidade ligada às raízes rurais: “Brasília sempre rejeitou ser capital interiorana. Na época da fundação, a imprensa do Rio dizia que aqui era terra de índio, tinha muita cobra, e Brasília seria uma capital do interior, de caipiras”. O outro fator é o alto poder aquisitivo da população, o que garante a frequência de acesso a viagens dentro do Brasil e ao exterior, onde se convive com diferentes pronúncias”. E o brasiliense vai criando seu próprio jeito de falar...

SONETO CONTA E TEMPO


Obra prima do trocadilho, escrito no séc XVII, por Frei António das Chagas, também conhecido por Padre António da Fonseca, (Vidigueira, 25 de Junho de 1631 – Varatojo - Torres Vedras, 20 de Outubro de 1682) foi um frade franciscano e poeta português.

                      
CONTA E TEMPO

 

              Deus pede estrita conta de meu tempo.

              E eu vou, do meu tempo, dar-lhe conta.

              Mas, como dar, sem tempo, tanta conta,

              Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?

 

              Para dar minha conta feita a tempo,

              O tempo me foi dado, e não fiz conta.

              Não quis, sobrando tempo, fazer conta.

              Hoje, quero fazer conta, e não há tempo.

 

              Oh, vós, que tendes tempo sem ter conta,

              Não gasteis vosso tempo em passatempo.

              Cuidai, enquanto é tempo, em fazer conta!

 

              Pois, aqueles que, sem conta, gastam tempo,

              Quando o tempo chegar, de prestar conta

              Chorarão, como eu, o não ter tempo...

quinta-feira, 25 de junho de 2015

ERA UMA VEZ UM AUGUSTO CEARENSE NUM CHICO BRASILIENSE


 


Vanira da Silva Foster
Bolsa de ombro, como essas que hoje facilmente identifica um paulistano. Circulava pelos corredores do departamento de comunicação da Universidade de Brasília. E pelos teatros amadores da cidade. Era Augusto para os mais íntimos e Chico Pontes para os demais. Para mim, Chico.
Acho que me aproximei dele por meio do Clodo que na época terminava o curso de comunicação e de quem eu tinha sido auxiliar no curso de publicidade do colégio pré­universitário. Nunca era fácil os encontros com ele. Sempre me instigando, dizendo coisas muitas vezes incompreensíveis, insinuações indecifráveis. Eu, perdida nos meus 19 anos, recém ­universitária, aluna de publicidade (o jornalismo foi por acaso) e atriz amadora, às vezes fugia dele. Chico me bagunçava a cabeça e muitas vezes me irritava. Os que o cercavam já faziam pilhéria das histórias da mãe que morava num areal e da sua “proposital” falta de dentes.
Ficou claro que de alguma maneira me acompanhava. Levou Ednardo para ouvir a gravação do programa de rádio que eu tinha feito sobre poesia. Eles gostaram do tema e do programa. Ednardo pediu cópia. Depois, foram Rodger e Teti que o queriam tanto bem que me acolheram como a uma velha amiga.
Passou a conviver com meus amigos. De alguns era crítico severo. Foram muitas noites no Beirute, cantorias sem fim em bares e casas de amigos. Cantávamos Carneiro, O lago e outras composições dele e de Rodger, O relacionamento foi ficando mais próximo.
Um dia numa dessas cantorias, para minha surpresa, um amigo comum anunciou que cantaria a música que Chico havia feito para mim:”feito de conta este olhar/faz de conta que é pra mim/abra o seu sorriso mais que possa/quero entrar nessa festa de riso e olhar/meu coração está de novo aberto, pode entrar/eu estou só com os meus momentos /e uma saudade clara sua/festa de corpo e alma nua/meu coração com mil tormentos”. Era Folia ou Pressa.
Nunca consegui entender o que tivemos. Anos depois fui visitá­lo no Ceará. Eu já era divorciada e ele viúvo de Cristina Borracha. Foi bom rever Fortaleza ao lado dele. Depois de ouvirmos Rodger em um dos bares da cidade, em outro bar ouvimos gravação de uma cantora que ora parecia cantar em português ora não. Era Cesárea Évora. Ele sabia bastante sobre ela.
Foi noite de muitas conversas, inclusive sobre o livro que publicaria. E sobre o qual conversamos com um outro amigo dele daqui que encontramos em Fortaleza – agora me foge o nome. Peti? Talvez. Falamos até sobre nós. Disse que aos 19 anos não consegui entendê­lo. E que agora(lá em Fortaleza) aquilo não mais fazia sentido.
Nos falamos pelo telefone algumas poucas vezes depois da tal viagem. Vê­lo, nunca mais. Soube meses depois da morte dele que havia morrido. Fiquei triste porque não tinha mais dúvida de que gostava dele. De que todas as vezes que ouvisse Cesárea Évora me lembraria dele. De que o guardaria sempre num lugar especial, no limbo das emoções, no cantinho da certeza dos bons afetos, nos voos sem turbulência. Vez por outra canto Folia ou Pressa, na incerteza se é pra mim.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

JANIS JOPLIN, EMBRIAGADA, CANTA EM BAR DE COPACABANA PRA NÓS

 

 
Zeca Zines (Ednardo)

Amigo querido o Jornalista cearense Wilson Ibiapina que reside em Brasília, vindo aqui pelo Rio de Janeiro, telefonou pra fazermos uma tour de conversas e algumas bebidinhas em Copacabana. Saímos conversando e passeando a pé. Neste tempo soubemos que a grande cantora de blues Janis Joplin estava pelo Rio, e coincidentemente ou não encontramos uma pessoa que pensávamos ser ela com um acompanhante.
 
Fato é que ao chegarmos na esquina da Avenida Atlântica com Princesa Isabel, entramos num bar / restaurante / show, e na saideira, entra uma pessoa esfuziante e pega o microfone, com os cabelos revoltos e aquela voz rouca e maravilhosa e tal semelhança com Janis Joplin, cantou à capela Summer Time, um de seus clássicos, a voz era idêntica demais e perfeita, e a saideira tornaram-se várias, não sei se nós já estávamos turvos, mas aplaudíamos como se estivéssemos assistindo uma intervenção artística inusitada de Janis pelo Rio. Quando saímos ainda perguntei ao garçon - É Janis Joplin ? e o cara respondeu - não sei, por aqui aparece tanta gente estranha... rsrs....

Mas não acho de todo impossível que isto tenha de fato acontecido, basta ler uns trechos que o Jornal O Globo publicou em 2014: “Janis chegou numa sexta-feira pré-folia, na companhia de Linda Gravenites, que assinava os exuberantes figurinos usados pela cantora nos palcos. No curto período em que passou na cidade, ela assistiu aos desfiles das escolas de samba na Candelária, fez topless na Praia da Macumba, foi barrada num camarote do Theatro Municipal e deu canja em inferninhos da Zona Sul, além de beber vodca, Fogo Paulista e licor de ovo como se não houvesse amanhã.
 
Ricky, que era fotógrafo da versão brasileira da revista “Rolling Stone”, encontrou Janis com a amiga perambulando sem rumo pelas areias da Praia de Copacabana. A musa do movimento hippie apareceu no Copacabana Palace sem marcar reserva e, segundo ele, foi expulsa do hotel depois de ter nadado nua na piscina.
 
Com seu cicerone brasileiro, Janis Joplin badalou pelo underground carioca. Numa noite, os dois foram parar na boate Bolero, inferninho frequentado por prostitutas e marinheiros que funcionava na Avenida Atlântica, na altura da Rua República do Peru. Logo que entraram, a cantora foi reconhecida pelo roqueiro Serguei, que naquela ocasião atacava de crooner, à frente de uma pequena orquestra. Na mesma hora, ele anunciou a presença “da maior cantora de todos os tempos” e a chamou para subir ao palco. O pedido foi aceito prontamente, mas Janis teve que cantar a capela, porque os músicos não faziam a menor ideia de como executar seu repertório. O lugar era superfuleiro, tinha até basculante atrás do palco. Mas Janis detestava lugar da moda e então ficou muito à vontade. Foi impressionante. Quando ela terminou de cantar, todo mundo que estava lá mandou garrafas de bebida para a nossa mesa. Tomamos um senhor porre — diz Ricky.
 
Janis também soltou a voz na boate Porão 73, que ficava no Leme, a convite de Serguei. O roqueiro, hoje octogenário, conta que esbarrou de madrugada com a estrela no calçadão de Copacabana, agarrada ao americano David Niehaus, que ela conheceu no Brasil. Os três chegaram à porta da casa de shows às três da madrugada. Vestida com uma blusa, uma saia estampada no estilo cigana e uma faixa amarrada na cabeça, Janis por pouco não foi barrada pelo gerente da casa noturna — um português que, de acordo com Serguei, confundiu-a com uma mendiga. Lá dentro, ela levou a plateia ao delírio quando cantou um dos seus maiores clássicos, “Ball and chain”, com um copo de vodca na mão”.

Pelo sim, pelo não, conversei muito tempo depois com Wilson Ibiapina pra saber se ele se lembrava, e se isto era verídico ou não. Perguntei: - Ibiapina, tire uma dúvida por gentileza, foi com vc que ví a Janis Joplin cantar em um bar de Copacabana? Ela entrou embriagada no bar e cantou a capela Summer Time.

E o Ibiapina disse - "Foi não, mas pode espalhar que foi. Eu também estava de porre, lembra? " - kkkk..

terça-feira, 23 de junho de 2015

PAES DE ANDRADE

 

Wilson Ibiapina
 
Dia 23, véspera do dia de São João, foi a missa de sétimo dia para Paes de Andrade. Na igreja, enquanto o padre rezava, recordava como Paes de Andrade se comportava exemplarmente num meio de traições, desonestidade, falta de ética e de moral.



Não lhe faltou coragem para enfrentar a ditadura militar nem os adversários políticos. Um dia, no Ceará, ao chegar a um recinto na companhia do jornalista Hermenegildo Sá Cavalcante, sentiu-se cercado de inimigos políticos com seus capangas. Puxou duas pistolas e entregou uma a Hermenegildo a quem pediu cobertura. O jornalista soltou a arma no chão e gritou: - Paes, quero ser testemunha!
Gostava de se gabar da pontaria que nunca precisou usar ao longo de sua carreira política. Acertou muita gente com palavras, a arma que usou toda vida para defender suas teses, o estado de direito, a democracia.



Era um intelectual. Quando chegou a Lisboa como o segundo cearense a ocupar a embaixada brasileira (o primeiro foi Dario Castro Alves), Paes já conhecia de cor e salteado a obra de Eça de Queiroz, recitava Fernando Pessoa. Publicou dezenas de livros, entre eles, a reestruturação agrária do Nordeste (1968), Afirmação democrática do Nordeste (1971), O itinerário da violência (1976), O poder absoluto (1977), A violência da reforma e a denúncia de Caracas (1979), Francisco Pinto, as imunidades parlamentares e a Lei de Segurança Nacional (1980), As secas (1980), O poder ou o subpoder (1980), A greve no ABC e os bispos do Brasil (1980), A universidade e o professor (1980), CNBB e reflexão cristã, O Poder Legislativo e o golpe militar na Bolívia (1980), A inviolabilidade absoluta, Dom Hélder e o seu cinquentenário de ordenação (1981), Comemoração do CLX aniversário da Confederação do Equador, 1824-1984 (1984), Proposta de ação econômica e social (1985), A Interparlamentar e os direitos humanos (1987), O Brasil e a União Interparlamentar (1988), Perfis parlamentares: Martins Rodrigues (1989), e Presença na Constituinte.
A História Constitucional do Brasil, que escreveu com Paulo Bonavides, teve três edições e chegou a ser lançada no Instituto Mário Soares, em Lisboa.



Dramático. Quando recebia qualquer tipo de pressão gostava de exclamar, com as mãos levantadas: “querem me matar!”. Certa feita, depois de uma eleição, Paes foi pagar com um imóvel o dinheiro que pedira emprestado para a campanha. O ganancioso empresário, queria mais: “só tem isso, Paes? - Não, tenho meu figado, o meu coração...



Honradez foi sua marca. A única coisa que conseguiram dizer dele foi que levou um grupo de amigos à Mombaça, sua terra natal, em uma das doze vezes que assumiu a presidência da República. Era presidente da Câmara e substituía o presidente José Sarney. Uma viagem que todos os que passaram pelo Planalto fizeram para homenagear suas origens. Foi um amigo dos amigos, correto e leal. Deixa a viúva Zildinha, quatro filhas, netos e bisneta. Um cearense pra ficar na história do estado e do país.


 
 
 

segunda-feira, 22 de junho de 2015

COM CALMA E ELEGÂNCIA

 
Sergio Costa
 
Mudou o superintendente DNOCS. Dizia-se ser homem correto, íntegro, incorruptível. Botava o Eliot Ness (é assim mesmo?) dos intocáveis no chinelo. Lançada licitação de
grande açude público, assessoria de deputado dono de empreiteira, marcou audiência com o Durão. O Deputado era homem educado, de fino trato, jogador de pôquer, pragmático, não dava ponto sem nó. Certa feita, depois de acertar o pagamento de um colégio eleitoral, ouviu do remunerado cabo eleitoral:
 
- Deputado, o povo de Reriutaba tá doido lhe conhecer.
 
- Meu caríssimo prefeito, taquí mais duzentos mil pro povo não me conhecer?
 
Pontualidade britânica, superelegante a bordo de bem talhado terno de linho acetinado S120, foi recebido com a frigidez dos burocratas pelo Durão. A relação prenunciava-
se difícil, mas como costumava dizer o nobre representante do povo, “não existe
instrumento ruim, existe tocador ruim”.
Depois de muitos cafézinhos e mississipes e mississipes de água mineral, a distancia entre o Durão e o Elegante era abissal. O Elegante Deputado falou sobre quase tudo: campeonato cearense de futebol; a posse do Papa João XXIII; a pesca da lagosta; as meninas do cabaré da Margô; o uísque da tardinha no Country Club; a maionese do Lido; O Jornal do Bonaparte Pêmaia... nada interessava ao impassível Durão, que perdido num antártico mutismo observava o Elegante Deputado como estranha criatura chegada de alguma nebulosa perdida na imensidão cósmica.
Depois de quase duas horas de papo furado o Durão, que parecia um autista, falou:
 
- Deputado, não me leva a mal. Tenho muito que fazer. Já estamos aqui há quase duas horas e o senhor ainda não disse a razão da sua visita ao meu gabinete. Deputado, trocando em miúdos...
 
- Doutor, se trocar em miúdo não vai caber no seu bolso...
 
Moral da história: com cuspe e jeito não tem buraco estreito.

PASSEANDO PELA HISTÓRIA COM RONAN SOARES




Ronan Soares
 
Maria do Correio - as cartas não mentem jamais.
 
Uma das pessoas mais incríveis que conheci na vida foi a Maria do Correio, cartomante de Araxá - que assim se chamava, claro, porque era funcionária dos Correios.
 
História um: na sala dela, para saber do futuro, Magalhães Pinto, o deputado José Sarney, o escritor Fernando Sabino e o meu primo, jornalista Toninho Drummond. Magalhães queria saber se seria presidente da República; Maria olha pra todos, antes de ouvir cada um, fixa os olhos na figura mais discreta que estava no fundo da sala, e diz em voz alta: "Aquele ali vai ser o presidente da República", e apontou pro Sarney, que não estava lá para saber do futuro.
 
História dois: Maria do Correio recebeu um jovem ambicioso, que estava com a namorada em Araxá. E ele perguntou pra ela assim: "Eu queria saber se vou casar com ela", e a Maria do Correio disse assim: "Você não vai casar com essa moça, mas vai ser presidente da República". O jovem simpático era Fernando Collor de Mello.

TRANSPOSIÇÃO REDENTORA


 
O Projeto de Integração do Rio São Francisco é a maior obra de infraestrutura hídrica do país e figura entre as 50 maiores construções de infraestrutura em execução no mundo, diz o Ministério da Integração.
Quando vejo a dificuldade que o governo vem enfrentando para transpor o rio São Francisco, lembro a obra monumental que os chineses executaram  em 486 A.C, na época, uma das maravilhas do mundo.Um canal ligando a China de norte a sul para transportar alimentos e irrigar as áreas em sua extensão.
A transposição do São Francico  prevê a construção de 700 quilometros de canais de concreto em dois eixos beneficiando Pernambuco, Ceará, Paraiba e Rio Grande do Norte, os que mais sofrem com a seca. Vinte e oito por cento da população brasileira vive no Nordeste que só tem três por cento de disponibilidade dágua.
O canal chinês se estende por 1.800 quilometros e, ainda hoje, é a mais longa via fluvial construida pelo homem. O canal foi ampliado em 1411 por Zhu Di, fundador da dinastia Ming, o mesmo imperador que transferiu a capital chinesa de Nanquim para Pequim, onde ergueu a cidade proibida, O canal liga Pequim, ao norte, a Hangzhou, na costa, ao sul de Xangai. Metade dos 6 milhões de operários morreu na construção.
A transposição do velho chico vai levar água para o agronegócio e matar a sede de nordestinos de quatro estados. São 4 tuneis, 14 aquedutos, 9 estações de bombeamento e 27 reservatórios, além da recuperação de 23 açudes. Serão atendidas 325 comunidades que residem a uma distância de cinco quilômetros da margem dos canais dos Eixos Norte e Leste. Dos 22 municípios beneficiados nesta iniciativa, 11 estão em Pernambuco, cinco no Ceará, cinco na Paraíba e um na Bahia.
Segundo o Ministério da Integração, assim como ocorre a integração do rio São Francisco no Brasil, outros países também adotaram ações semelhantes para enfrentar a falta de oferta de água. Veja alguns exemplos das principais transposições de água no mundo:
 
  • Projeto Colorado-Big Thompson, EUA: Conjunto de 12 reservatórios, 56 quilômetros  de túneis  e 153 Km de canais que transpõe as águas do Rio Colorado a oeste das Montanhas Rochosas para sua vertente leste em direção ao Rio Big Thompson.
 
  • Sistema Hidrelétrico das Montanhas Snowy, Austrália: Conjunto de 16 reservatórios, sete usinas, uma estação de bombeamento e, 145 quilômetros de túneis e 80 km de adutoras que coleta e armazena água que normalmente fluiria  do leste para o litoral, sendo desviada do Rio Snowy para os rios Murray e Murrumbidgee. Estimativa de custo: US$ 820 milhões.
 
  •  Projeto de Transferência de Água de Wanjiazhai: Conjunto de adutoras na região noroeste da Província de Shanxi, com três eixos distintos com 44 quilômetros, 100 quilômetros e 167 quilômetros, extraindo água do Rio Amarelo-Huang He.) Estimativa de custo: US$ 1,5 bilhão.
  
  • Transposição Tejo-Segura, Espanha: Transferência de água da bacia do Rio Tejo, localizada na vertente do Oceano Atlântico da península ibérica, para a bacia do Rio Segura, região seca situada no sudeste da Espanha.
  •  
  • Projeto do canal El-Salaam, Egito: Construção de adutora de 150 quilômetros que transportaria água de sistema de esgotos misturada à água do Rio Nilo do delta do rio para o Sinai.
  • Projeto Especial Chavimochic, Peru: Túneis, canais abertos, adutoras enterradas e sifões trazendo água para regiões mais elevadas dos rios localizados nas proximidades da costa norte do Peru.
A transposição do São Francisco, iniciada em 2007, tinha sua conclusão prevista para 2012. Atraso na obra obrigou mudar a inauguração para o próximo 2016.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

DIZEM QUE ACONTECEU


POEMA DA TARDE CHUVOSA


 
Sávio Roberto Moreira Gomes
                                       
Solene, se inunda a tarde,
com tão abundante chuva,
e o ar transpira o odor
da terra molhada,
enquanto me mantém recluso
no oco da solidão escolhida.
Agitam-se afoitos relâmpagos
por entre venezianas, frestas,
e desvãos da alma,
escorrendo pela folha
o árido poema.
Ponho-me quieto,
Respeitoso, perante lampejos
e lembranças de tempestades,
tantas, ao longo do caminho.
Discreto, um fio dágua
desce pela vidraça,
numa lágrima possível.
Do telhado, grossos veios
transformam-se no chão
em loucos bailarinos,
que engraçados, dançam
num perfeito ritmo.
A chuva agora aumenta,
mas logo se aquieta,
vai se afinando, lentamente.
Como mágica, uma poeira dágua
se transluz e enfeita a tarde
num perfeito mini arco-íris,
entre o telhado e a janela.
Toda a solenidade se dispersa,
A tarde volta a sorrir.

PARA PENSAR O CEARÁ

 

 
João Soares Neto
O Governador Camilo Santana deseja reunir os ex-governadores do Ceará. É medida de bom senso e demonstra que os saberes de pessoas como Cid Gomes, Lúcio Alcântara, Tasso Jereissati, Ciro Gomes, Gonzaga Mota e Adauto Bezerra não podem/devem ficar deslembrados no momento de crise que o Ceará e o Brasil atravessam.
Cada um dos citados tem história pessoal como chefe do poder executivo e deve oferecer contribuições significativas nas áreas mais afetadas e as sucessivas secas. São todos cientes da falsa promessa da refinaria “Premium” e do estratagema montado pela FIFA, por ocasião da promessa que foi a Copa do Mundo do ano passado, de triste memória, que nos deixou encargos a solver e obras ainda pendentes.
A atitude de Camilo Santana, deve partir da premissa de que somos um Estado pobre, com máquina administrativa pesada, cara e de baixa resposta de gestão. Acredito que, serenados os óbices das diferenças naturais dos seres humanos e as desavenças de partidos e alianças políticas, há muito que agregar.
Esses ex-governadores, além das relações com diferentes administrações federais, tiveram convivência com secretários de áreas fundamentais, como saúde, educação, fazenda, desenvolvimento agrário e econômico, combate às secas e planejamento para ficar apenas nas ações e carências mais visíveis.
O orçamento do Ceará para 2015 prevê uma arrecadação de 23,6 bilhões de reais, o que corresponde a 1,91 % do orçamento da União, que chega a 1,235 trilhão. Ora, se somos menos de 2% da renda ou da receita bruta nacional, entre 27 Estados, é porque não atingimos o patamar de desenvolvimento que se esperava desde a primeira administração do governador Virgílio Távora, quando a energia da Chesf chegou a Fortaleza e acreditou-se, através de um Plano de Metas Governamentais - Plameg, que sairíamos do patamar baixo em que nos encontrávamos como ente federativo.
O Ceará é ainda carente de infraestrutura básica que possa atrair grandes projetos. Há deficiências indesculpáveis - a causar doenças - de saneamento básico, de habitações populares, de estradas para escoamento da produção, de indústrias estruturantes e de turismo não predatório.
Dessa análise superficial, emerge a certeza de que há urgência em reunir a inteligência cearense para dar um fim ao que se tomou, durante muito tempo, como conformação e destino de ser pobre e subdesenvolvido. Não como fogueira da vaidade, mas para fumar, mesmo que em termos, o cachimbo da paz necessária.
Os ex-governantes têm experiência comprovada e cabedal para dar, ao aberto e ainda iniciante governo Camilo Santana, suporte de ideias e de atos consequentes que nos façam sair dessa desfavorável posição do Ceará no ranking brasileiro.
O Ceará gastou com desapropriações, projetos, terraplenagem e propaganda intensiva um valor significativo, talvez algo como dois bilhões de reais, e nada recebeu, afora promessas em sucessivas pedras fundamentais da tal refinaria que, na verdade, parece nunca ter sido objeto de compromisso formal da Petrobras, tal a forma fria com que os dois últimos ex-presidentesda empresa tratavam do assunto, quando questionados aqui, na Assembleia Legislativa, em Brasília e no Rio, onde fica sua sede.
Em dezembro de 2014, exato nos dias 2, 3 e 4, pouco antes de assumirem, Camilo Santana e Izolda Cela planejaram e realizaram Seminário, com conteúdo e didática, para elaborar propostas a um plano de governo. Esse documento foi enfeixado no livro “Os 7 Cearás – propostas para o plano de governo”. Na capa amarela desse opúsculo, encimando o seu nome, há sete palavras, sem vírgulas entre elas: “Conhecimento Democrático Pacífico Saudável Acolhedor Oportunidade Sustentável”.
Camilo Santana tomou-o como compromisso básico e formal, com uma visão participativa de 1.300 pessoas entre técnicos, professores, acadêmicos, políticos e outros profissionais experientes reunidos no Centro de Eventos do Ceará, entre os quais cito, não por falta de merecimento dos demais, Eudoro Santana, Élcio Batista, Joaquim Cartaxo e Roberto Cláudio Bezerra.
O Ceará deve ser muito maior do que as divergências pessoais/partidárias de seus representantes no Congresso Nacional, as marcações de posições dos que ficaram na oposição e a defesa dos que integram a situação na Assembleia Legislativa. O momento brasileiro pede reflexão e ação dos que podem modificar o ‘status quo’ que emperra o nosso desenvolvimento sustentável. Os deputados federais eos senadores Pimentel, Eunício e Tasso devem ouvir, opinar e ajudar.
A atitude de Camilo Santana não parece jogo de cena, mas gesto voluntário para um concerto dos que, de formas antagônicas ou não complementares, são corresponsáveis pela gestão do Ceará. É preciso acreditar e agir.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

AYRTON, O PINTOR E SUAS CORES

AYRTON ROCHA JUNIOR



"A MULHER DO AGRESTE ", NA BELEZA DA ARTE DO AYRTON, ONDE ELE RETRATA NUM EXPRESSIONISMO PRÓPRIO, A MULHER E O AGRESTE NORDESTINO, NUM ÓLEO SOBRE TELA COM SUA PINTURA CONTEMPORÂNEA.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

BODEGA

 
 
Totonho Laprovitera
 
O bodegueiro cochilando, tem bucho quebrado,
Ceroto no pescoço, mau humor e os zói trocado
Em todo canto, no interior, no litoral, até na Capital,
Como a bodega que frequento, não existe outra igual
Na fachada tem cartaz desbotado do calor,
Tem de presidente, senador, governador
De deputado tem estadual e federal,
Vereador, prefeito, cada qual é mais o tal
A calçada é baixa e a porta escancarada
O nome da bodega ta na placa estampada
Pendurada e com reclame de refrigerante,
Água mineral e de algum embriagante
Vende à vista e também em caderneta,
Só para troco é a grana da gaveta
E pra mau freguês, já bem cedo de manhã,
Na cartolina tem o aviso “fiado só amanhã”
Com ladrão o proprietário perde a estribeira
Tem pimba de boi, uma boa lambedeira,
E um jucá pesado, feito sob encomenda
Aí, é pisa grande, como bem se recomenda
Pro bom freguês, eu digo o que é que ela tem
Só de artigo, já contei, tem pra mais de cem
Para vender, tem de tudo um pouco
E vou dizer, nem que eu fique rouco:
Tem seco e tem molhado, penico e mingau,
Caderno Avante! ao lado, bico-doce e Melhoral
Santim com oração, no telhado uma goteira,
Espelho com moldura, fumo de rolo, ratoeira
Balança Filizola, café, corda-de-alho,
Tem goma e Maizena, cigarro a retalho
Cocada, rapadura, bolacha e feijão,
Cola de dentadura, sardinha e macarrão
Batida, quebra-queixo, beiju e tapioca,
Saquim de pipoca, farinha de mandioca
Tem ovo pé-duro, tem queijo-de-coalho,
Fatia de bolo, rosca e chocalho
Rádio de válvula véi bem na prateleira,
Tocando forró, música brasileira
Dá notícia, matraca o dia inteiro,
Manda recado até pro estrangeiro
Pão-doce com refresco, mastruz e aroeira
Dindim na geladeira, tem chá de erva-cidreira
Cartão de telefone, todo tipo de bebida
Tem piula do mato, pomada pra ferida
Tem lanterna e vela, lamparina e candeeiro
Tem colher de pau, urupema e papeiro
Fubá, cuscuz, armador, punho-de-rede,
Penca de banana e briba na parede
Gato preguiçoso, muita teia-de-aranha,
Caneca de alumínio, leite em pó, lata de banha
Carvão e abanador, latido de cachorro
Bombom, chiclete, tem pirulito Zorro
Caixa de fósforo, botijão de gás,
Tutano, mão-de-vaca, torreis e aguarrás
Tem colchão-de-moça, Q-boa e queijada,
Bolacha fogosa e lingüiça pendurada
Tem breu e creolina, anilina e sabão
Óleo de côco e pilha, cera e facão
Guardanapo, barbante e chapéu
Papel de lixa pra limpar o carretel
Pente Flamengo, lápis com borrachinha,
Pôster de time, seleção, a canarinha
Mamadeira, maracá, carrim de plástico
Ioiô, de baladeira tem de bom elástico
Livrim de tabuada, tem sandália japonesa
Folha de mulher pelada, no cromo uma beleza
Vassoura, espanador, veneno pra formiga
Enxada pra agricultor, remédio pra lombriga
Tem mercúrio-cromo, Merthiolate de alcunha,
Acetona, esmalte, serrinha, cortador de unha
Sonrisal, naftalina, Cibalena, aspirina
Pão sovado e semolina, manteiga e margarina
Tem Vick-Vaporub, tem um bom rapé,
Foguete, rasga-lata, traque pra arrasta-pé
Tem tamborete, óleo de cheiro, sim,
Brilhantina, pente, escova pra pixaim
Tem pé-de-moleque, canjica e xerém
Farinha de milho, açúcar, também tem
Botão, dedal, grampo e fecho ecler
Fluido de isqueiro, querosene Jacaré
Faca amolada, canivete cego e marmita
Batom, ruge, pó-de-arroz e laço-de-fita
Agulha, linha, colchete, alfinete
Pasta de dente, perfume e sabonete
Buraco, paciência, uma mesa posta
Pife-pafe, relancim, um baralho e uma aposta
Tem jogo de dama, tem jogo de sinuca
Roleta, jogo do bicho, sorteio de cumbuca
Na bandeja a poeira, bebo bebendo tanto
Cachaça com Coca-Cola, no chão tem a do santo
No copo americano a cerveja não tem fim
Um vale e um Cibazol, tira-gosto de toicim
Tem cajá, limão, tem bacia de piaba
Pimenta malagueta, tem e é da braba
Com ela não exagere, aconselha o ancião,
Demais é venenosa, oi-da-goiaba vira jogo-de-botão
Verdura e legume, tem óleo a granel
Como de costume, mosca no pastel
Sarapatel, buchada e sarrabui, no sábado é de lei
Panelada no domingo pra bebim dos zói vermei
Corda de violão, carne seca no prato
Pião, Bombril, gilete, barbeador barato
Tem sal, tem colorau, tem doce caseiro
Foice com bainha, biriteiro presepeiro
Abestado e sabido, tem rico metido à nobre
Atrevido e fingido, tem cabra pedindo à pobre
Desocupado, aposentado, tem bacharel
Malandro, trabalhador, tão todos no mel
Na conta a confusão, um tabefe de canhoto
Falta de educação, muito peido e muito arroto
Pra quem quiser mijar tem lata atrás da porta,
Pro barro derrubar o ambiente não comporta
Amarelo empombado, com espinha e ameba
Tem menino buliçoso com remela e pereba
Sem papel e sem tostão, depende da ocasião,
Tem poeta escrevendo é em cima do balcão
Pois é boêmio, na verdade, e conhece a adição
Quando busca no lugar a sua inspiração:
Pra gente ter bodega, na vida é só somar,
O amigo velho bar com o nosso doce lar!

Homenagem 80 anos Wilson Ibiapina