segunda-feira, 8 de junho de 2015

VOLTANDO DAS FÉRIAS

Começamos nossa nova temporada com um brinde aos amantes da boa escrita. Textos do jornalista Ronan Soares, um dos mais criativos profissionais da letra.
 
Pra que não o conhece, um pouco da história:
 
 
Ronan Soares Ferreira nasceu em Araxá, interior de Minas Gerais. Seu interesse pela comunicação surgiu na oficina de material elétrico de um tio, onde ele começou a trabalhar com apenas sete anos – o tio montava rádios. Seu avô, assinante do jornal O Estado de S. Paulo, ensinou-lhe a importância de ler jornais. Começou, então, a tomar gosto pelas palavras, e escrevia por passatempo.
Aos 16 anos, foi morar em São Paulo, sozinho, e começou a trabalhar em um banco. A chefia, vendo que o funcionário gostava de ler e escrever, o escalou para fazer o primeiro número de uma revista do banco. De volta à Araxá um ano depois, escreveu uma coluna de humor em um jornal local e, posteriormente, trabalhou em uma rádio.

Em 1959, viu-se diante de duas possibilidades de carreira: uma no Rio de Janeiro, e outra em Belo Horizonte. Optou por uma terceira via e foi para Brasília, que, naquela época, ainda estava em construção. Como ainda não havia uma boa oferta de empregos, começou a trabalhar no departamento pessoal de uma construtora. Não muito tempo depois, intermediado por Olavo Drummond, dono da rádio onde trabalhara em Araxá, foi para a Rádio Nacional em Brasília. Pediu para ficar na área de programação musical, mas não foi atendido. Suas primeiras matérias foram sobre a construção de Brasília, e, em 1960, cobriu festa de inauguração da Capital Federal.

Foi cobrindo o dia a dia do presidente Juscelino Kubitschek que Ronan Soares começou a se fascinar pelo jornalismo. Em 1961, com Jânio Quadros já eleito, teve alguns problemas. À época, além do trabalho na Rádio Nacional, o jornalista também tinha uma coluna de humor em um jornal chamado Candango, na qual debochava do presidente eleito – com direito a uma charge onde Jânio era retratado como um Dom Quixote bêbado. Como a Rádio Nacional pertencia ao governo, não podia manifestar sua aversão ao presidente, e passou a ter conflitos com colegas de estação. Em agosto de 1961, escreveria a nota que seria lida na Rádio Nacional, informando, em primeira mão, sobre a renúncia de Jânio Quadros.

Já no governo do presidente João Goulart, foi convidado para o cargo de assessor de imprensa de Tancredo Neves, primeiro-ministro no período entre setembro de 1961 e junho de 1962, quando o Brasil foi uma República parlamentarista. Em 1963, o presidencialismo seria escolhido pelo povo a nova forma de governo. Nesse cargo, entre outras funções, era o responsável pela redação de atas de reuniões, e acabou se aproximando ainda mais do universo da política.

Depois disso, transferiu-se para o jornal Correio da Manhã, onde acompanhou de perto a crise do governo Jango. Paralelamente, ingressou na sucursal do Estado de S. Paulo em Brasília, vivendo, assim, uma situação curiosa: como cada jornal tinha o seu alinhamento político, Ronan Soares se viu obrigado a escrever sobre os mesmos temas com enfoques distintos. Nesse período, cobriu mais um episódio importante da política brasileira: a queda de João Goulart e o golpe militar de 1964.

A partir do golpe militar, prosseguiu apenas no Estado de S. Paulo, pois o Correio da Manhã, feroz opositor ao regime, acabou fechando por pressões políticas. Nessa fase, cobriu os governos Castelo Branco, Costa e Silva e parte do mandato de Médici. No Estado, conheceria o jornalista
Evandro Carlos de Andrade, que dirigiu a sucursal do diário paulistano em Brasília e, posteriormente, chefiaria Ronan Soares também no jornal O Globo. Acompanhou o endurecimento do regime militar e, em 1971, cansado da cobertura do Palácio do Planalto, foi transferido primeiro para a editoria de Economia e, depois, para a cobertura do Itamaraty.

Nesse período, chegou a ser convidado para trabalhar na Globo, mas recusou – não sem antes indicar uma série de profissionais para a emissora, como o repórter
Geraldo Costa Manso, o apresentador Celso Freitas e o repórter cinematográfico José Dantas. Posteriormente, no entanto, desencantado com Brasília e com a cobertura de política, decidiu ir para o Rio de Janeiro, onde começou no jornal O Globo.

No jornal carioca, foi repórter de Geral por menos de um ano. Em 1975, foi escalado para cobrir a fusão do Estado do Rio com a Guanabara, e o fez tão bem que impressionou o então secretário de Planejamento do Estado, Ronaldo Costa Couto, que o convidou para trabalhar como seu assessor de imprensa.

Convite aceito, trabalhou alguns meses com o secretário e, nesse ínterim, voltou a ser procurado pela Globo – muito graças a pessoas que ele indicara para a emissora, como Costa Manso, então um repórter de prestígio. Em dezembro de 1975, convidado por
Alice-Maria, diretora de telejornais da Globo na época, foi para o Jornal Nacional, onde rapidamente chegou ao cargo de editor.
Em 1976, foi um dos profissionais a presenciar o incêndio da emissora. Um curto-circuito no sistema de ar-condicionado iniciou o fogo no prédio da Rua Von Martius, no Jardim Botânico. O incêndio começou às 13h, durante a transmissão do telejornal Hoje e, apesar dos estragos, a emissora ficou apenas alguns minutos fora do ar, pois, imediatamente, as imagens passaram a ser geradas de São Paulo – inclusive o Jornal Nacional com as imagens do incêndio, editadas por Ronan Soares. Foram três meses de trabalho em São Paulo até o restabelecimento das atividades no Rio de Janeiro.

Como um dos editores do
Jornal Nacional, Ronan foi encarregado de ajudar a aumentar a produção de matérias regionais. Para isso, ao mesmo tempo em que enviava repórteres de rede para fazer estas matérias, passou a dar oportunidades para repórteres regionais, que começaram a aparecer mais no vídeo. Posteriormente, seria criado o Centro de Produção Nacional, que consolidaria uma série de iniciativas junto aos repórteres regionais que foram alçados por Ronan Soares.
 
Ronan também foi um dos editores do telejornal Amanhã, exibido entre 1975 e 1979. O programa, que ia ao ar depois das 22h30, exibia reportagens que não podiam ser mostradas no Jornal Nacional. “O militar dorme cedo” era um dos argumentos ouvidos nos corredores do jornalismo para emplacar matérias no fim da noite. No Amanhã, escreveu reportagens tão distintas quanto uma sobre as implicações históricas da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética e outra sobre a retomada do ensino de educação sexual nas escolas brasileiras.

A partir de 1977, acumulou também a função de editor no Rio do recém-criado
Painel, um programa jornalístico que inaugurou a etapa de entrevistas em estúdio no telejornalismo da Globo. Sendo um programa novo e menos visado, o Painel também serviu como alternativa para o tratamento de questões políticas, que sofriam vigilância constante do governo militar no Jornal Nacional. Uma entrevista importante na época foi a do então líder dos metalúrgicos, Luiz Inácio Lula da Silva. O programa acabou em 1978, mas teve sucessores, entre eles o Globo Revista, que foi ao ar entre 1981 e 1982, também editado por Ronan Soares.
Nesse período, mesmo com o governo impondo a censura, acompanhou coberturas importantes feitas pelo Jornal Nacional, como a das eleições de 1976, das greves do ABC, em 1978, dos atentados à sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e à Câmara dos Vereadores, em 1980, e ao Riocentro, em 1981, e da campanha Diretas Já, em 1984. Outras coberturas menos ligadas à política, como a das enchentes no Sul e a da seca no Nordeste, em 1983, também foram editadas por ele para o JN nessa época.
Ronan Soares também dirigiu programas da série Retrospectiva, que é exibida desde 1967 no fim de dezembro ou no início de janeiro, e condensa os acontecimentos mais importantes do ano que passou. Nessa função, ajudou a introduzir uma importante mudança nos programas: na época, abriu-se mão de um roteiro cronológico para falar dos acontecimentos, e apostou-se no uso massivo de imagens, textos concisos e divisão dos temas por assuntos. O próprio Ronan Soares definia esse estilo como “jogos visuais sem ordem ou data pré-determinada”. Na tela, o efeito lembrava um mosaico: uma sequência da Retrospectiva 80, por exemplo, saltava da eleição do presidente norte-americano Ronald Reagan, ex-astro de filmes de faroeste, para a imagem de um sanfoneiro nordestino em Serra Pelada, ligando, subjetivamente, a ideia da conquista do Oeste dos Estados Unidos com a conquista de um território novo do Brasil.
Em 1985, foi transferido para Brasília, onde assumiu a coordenação da área de Política. No mesmo ano, acompanharia a cobertura da morte de Tancredo Neves. Na época, a orientação era tentar quebrar a formalidade com que era tradicionalmente associada à cobertura política – fosse no texto, fosse nas imagens. Em uma ocasião, por exemplo, na época do Plano Cruzado, a repórter Mônica Waldvogel fez uma matéria sobre inflação na qual jogava moedas na rua, para verificar se os passantes as pegariam.

Ficou como editor do
Jornal Nacional em Brasília até 1995 – com uma breve interrupção, quando foi trabalhar na Rede Bandeirantes. Nesse período, acompanhou fatos importantes como a Constituinte, de 1988, e a corrida presidencial entre Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva, em 1989.
 
Em 1995, Ronan Soares deixou a Globo e assumiu a gerência de coproduções do canal de TV a cabo GloboNews. Foi um dos editores do programa jornalístico Estúdio I e um dos editores da diretoria editorial de Entretenimento da Globo. Em seguida, passou a fazer a supervisão editorial do programa Pequenas Empresas, Grandes Negócios.
 
Em 2004, por ocasião dos 35 anos do Jornal Nacional, Ronan Soares colaborou na supervisão editorial do livro Jornal Nacional 35 anos: a notícia faz história, escrito pela equipe do Memória Globo.
[Depoimento concedido ao Memória Globo por Ronan Soares em 27/10/2003.]
 

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