segunda-feira, 6 de julho de 2015

PEDRO NAVA POR MONIQUE LE MOING

|Pedro Nava

João Soares Neto

 “Que somos nós!? Pronomes pessoais”. Mário de Andrade


Gosto de ler biografias. Agora, li “A Solidão Povoada” uma biografia sobre Pedro Nava, escrita, em 1996, em português, pela acadêmica francesa Monique Le Moing, para a sua tese de doutoramento.
Pedro Nava, mineiro de Juiz de Fora, era filho de Diva Mariana Jaguaribe, “moça de recursos”, e do médico cearense José Nava, membro da Padaria Espiritual, movimento fortalezense do fim do século 19. Nava nasceu em 1903 e viu seu pai morrer logo em 1911. A a sua primeira grande perda. Foi criado pela mãe Diva e pelos tios Alice e Antônio Sales, poeta e também padeiro espiritual.
Formou-se em medicina em Belo Horizonte e, em seguida, clinicou no oeste paulista. Aos 30 anos voltou ao Rio de Janeiro, onde havia concluído o ensino médio no Colégio Pedro II. Em 1942 casou-se com Nieta Penido. Com ela conviveu até a sua morte em 1984. Não tiveram descendentes.
Paralelo à sua vida como médico - dirigia clínica de reumatologia e era professor da Faculdade de Medicina no Rio - participava de papos com intelectuais tais como, os “sabadoyles”, na casa de Plínio Doyle. Da roda faziam parte, entre outros, Carlos Drummond de Andrade, Afonso Arino de Melo Franco e Joaquim Inojosa. Porém, Nava só começou a escrever literatura aos 70 anos.
O livro em análise é um trabalho sério de pesquisa, com a vantagem de ter sido escrito por uma não brasileira, o que pressupõe a isenção de Monique. Ela já havia - em sua tese de mestrado - dado a lume “O ciúme na obra de Machado de Assis e de Allain Robbe-Grillet: Dom Casmurro e La Jalouisie”, orientada pelo professor Silviano Santiago.
Monique justifica o caminho que tomou na biografia: “Uma polemica agitava então os meios intelectuais do Rio quanto ao fim de Pedro Nava: suicídio? Assassinato? Dizia-se que frequentava certos meios homossexuais do Rio de Janeiro e ninguém acreditava que ele fosse capaz de ter uma vida dupla, que tinha sido objeto de uma chantagem qualquer e compelido a um gesto de desespero. Meu interesse por seus escritos, incrementado pelo mistério que de repente envolvia a sua morte, assim como a recente descoberta dos arquivos, decidiram a orientação do meu trabalho”.
Ao meu olhar, bastaria Monique pesquisar a estreita ligação – e correspondência - de Pedro Nava com Mário de Andrade, nos anos 1920, para dar uma pista de sua preferência sexual. Foi Pedro Nava o autor das ilustrações do famoso livro “Macunaíma, um herói sem nenhum caráter”, de Mário de Andrade.
Sobre Mário, agora foi aclarada e publicada, se bem que de todos sabida, a sua homossexualidade. Monique, diga-se, foi, igualmente, a tradutora para o francês do livro de Mário de Andrade, “O Turista Aprendiz”, em que ele tenta compreender o Brasil, lapidar sua formação, narrar as suas peripécias, tirar fotografias, o que fez em duas viagens etnográficas ao norte e nordeste do Brasil, entre 1927 e 1929. Foi entre essas duas viagens que Andrade resolveu publicar “Macunaíma”, sua obra capital, em 1928.
Em ensaio da colunista Adriana Küchler, da revista sociocultural paulista “Serafina”, na Folha-SP, há uma declaração, talvez nova, sobre “Macunaíma”. Carlos Augusto Kalil, curador da Casa Mário de Andrade, diz que Mário quase copiou a obra “Vom Roraima zum Orinoco”, do etnólogo alemão Theodor Koch-Grünberg. E tem mais, na “bricolagem” usa trechos de Couto de Magalhães e até de Capistrano de Abreu.
Vou ficando por aqui, mas antes quero dizer que “A Solidão Povoada” é sólido em informações bem trabalhadas por Monique que, inclusive agregou ao texto o nome de todas as obras publicadas por Nava, incluindo poemas, trabalhos científicos e literários, memórias, prefácios, discursos, conferências, entrevistas, obras inéditas, correspondências – ativa e passiva –e, por fim, artigos escritos sobre médico/escritor, dentre eles, o do cearense Edigar de Alencar que o refere como “Um líder de inteligência nordestina”, por ele ter raízes cearenses.

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